XXIII - "Abrindo o portão do sitio ou melhor da África" e trazer para a Avenida todo aquele cenário de misticismo e magia do Afoxé, e buscar suas origens la na Nigéria numa região denominada Lagos, no reino de Oloxum onde se realizava a festa de Domurixá ai veio na minha cabeça uma letra e melodia que passei para o papel e comecei a solfejar, aquilo que seria o ponto de partida da nossa obra. A maioria dos compositores principalmente da minha época se atinha apenas no conteúdo da sinopse, eu não sei se por ser novo na área de samba enredo ou por querer fazer algo diferente, peguei o habito de pesquisar fundo os temas a mim confiado, principalmente quando o assunto e a misteriosa África com seus feitiços fascinios, encantos, um mundo insondável, místico, magico, colossal e foi numa dessas pesquisas que encontrei num livreto do Ministério de Educação e Cultura, uma narrativa da Mãe Menininha do Gantuá, sobre uma viagem que fez a Nigéria justamente na região de Lagos, quando ela constatou que Xangô, o único Orixá que viveu na terra como ser humano, e era originário da região de Lagos tinha predileção por Camelo (Embora o santo homem era uma espécie de São Francisco de Assis, amava a todos os animais), o julgava como animal sagrado por sua longevidade e resistência a sede ao sol e a chuva, e também encontrei no livro "África maravilha do terceiro mundo" a mesma referencia sobre o Camelo, muito diferente do que se propaga dirigentes do Candonblé no Brasil. (Mais tarde voltaremos a esse assunto) Então fui amadurecendo a ideia que a ultima frase do samba seria [Xangô em seu camelo sagrado/esta é a história do Afoxé/ que hoje desfila pelas ruas em rituais/ louvando os Orixás] e depois viria uma refrão cujo a letra não deixaria de ser de domínio público, só que colocaríamos uma melodia contagiante e de fácil assimilação, feito o esboço do samba fui procurar o João Belém para mostra-lo, foi numa tarde de segunda-feira o João trabalhava como motorista e transportava material para uma obra da Prefeitura Municipal de Niterói, num canteiro no final da praia de Icarai, depois de espera-lo algum tempo ele apareceu, surpreso com a minha presença em seu local de trabalho me indagou, - Você por ai. - É eu vim te mostrar alguma coisa que já aprontei do samba, depois de algumas conversas fora, comecei a cantarolar frases melodicas já pronta da nossa obra, e também o pus a par da conclusão a que tinha chegado em relação a interpretação do texto, comecei a notar que o que tinha feito o tinha agradado em cheio, depois de dar um sorriso de orelha a orelha ele disse; - Isso é uma bomba vamos pegar esse caminho, marcamos para fechar o samba no dia seguinte terça-feira, terminamos a obra e depois de solfejarmos bastante ficamos com a certeza que tínhamos feito um belo trabalho, nisso olho para o parceiro e tomei o maior susto, o João chorava copiosamente, só alguns tempos depois é que fui descobrir que meu amigo era um chorão contumaz, me convidou para no domingo seguinte ir comer uma feijoada na sua casa no morro do Abacaxi, queria me apresentar a sua família e alguns amigos de confiança lá do morro, ao chegar em sua casa constatei o tanto que o parceiro era querido na área, sua família além de ser grande, havia um bom numero de amigos na feijoada, depois de soborearmos a dita cuja e beber varias loiras soadas, convidamos o pessoal que não era pouca gente, para passarmos o samba, não foi surpresa nenhuma que depois de cantarmos algumas vezes a galera já cantava junto com a gente, dai a empolgação tomou conta de todos e eu ali extasiado ouvindo aquelas pessoas cantando com alegria me sentia um rei, tinha chegado o anoitecer e la do alto da favela olhando para baixo via casas e edifícios com suas luzes acesas numa explosão de brilho e cores numa beleza ímpar, senti meus olhos lacrimejarem, era a emoção de mais um trabalho feito um trabalho feito com amor, carinho e muita responsabilidade
XXIII -
XXII - Ao olhar para os rostos dos três diretores da junta, eu vi nitidamente estampado uma surpresa desagradável, pensei , por essa eles não esperavam, e tenho certeza de ter visto nos semblantes dos Diretores da Escola. aquele sorriso maroto disfarçado como se estivessem pensando; Quiseram armar e se deram mal. Ai a gente nota o quanto em poucos segundos temos a percepção de tantas coisas gira em nosso redor, absolvido no meu pensamento der repente ouço o João Belém me indagar como se não estivesse acreditando: - Você esta falando sério?; É lógico que estou, senão não faria essa proposta na frente de todos que estão aqui presente. Sim ou não, ele é claro que aceito, então continuei..- Fica assim fechado a nova parceria da Cubango para 1979, Heraldo Faria e João Belém. Passado esse assunto, o Presidente da Escola tomou a palavra e anunciou o enredo que seria "Afoxé" e em seguida apresentou a todos o carnavalesco que passou narrar o enredo, - Afoxé é um cortejo, dança-folguedo ligado ao candomblé, e acontece geralmente na sexta-feira que antecede o Carnaval, desfila pelas ruas cantado musicas em dialetos Africano, pedindo licença e proteção aos Orixás, para que a paz reine principalmente nos três dias de folia, etc. etc... Depois da explanação do enredo, ao sairmos da reunião conversei com o João Belém qual seria a melhor maneira da gente compor, me lembro que ele me disse que iria conversar com o parceiro dele João Bolão e depois se reuniria comigo, no que retruquei na mesma hora, - Nada disso, ou eu e você sentamos para fazer juntos, ou eu vou fazendo alguma coisa e você também e depois nos reuniremos para fechar o samba, não podemos aceitar intromissão de terceiros, e mais a mais o Bolão nem faz parte da Ala de compositores, no que ele aceitou no mesmo momento, tudo combinado, nos despedimos com abraço forte e naquele abraço eu percebi que o João estava empolgado em relação a parceria, fui para casa com o pensamento na sinopse e doido para chegar e começar a estudar o enredo, naquela noite só fui dormir na madrugada, li varias vezes a sinopse e pesquisei alguns livros do culto afro-brasileiro até que cai nos braços de morfélia, no dia seguinte acordei com a ideia de ir para o sitio do meu sogro que fica a uns dois quilômetros e meio da minha casa, ou melhor do centro de Cachoeiras de Macacu, um lugar prazeroso, silencioso e acochegante, onde a gente só ouve o cantar dos passaros, o som agradável do tilintar das cachoeiras e riachos e o uivar dos ventos cortando as matas verdejantes, da ideia a ação, pus-me a caminho do sitio, e ao chegar lá e vislumbrar a porteira que da acesso ao mesmo, me ascendeu a luz da senhora inspiração clareando a minha mente; Porque não começar a escrever partindo dali.
XXI - Nesse interim, o diretor Ary Sérgio chegou a mim e falou - o Tapê esta no salão debaixo em companhia de Clebinho e Flavinho e pediu que você como secretário desse inicio a reunião e participasse ao plenário o que foi decidido a respeito de João Belém na reunião da junta governativa da Ala de compositores, que eles já estão subindo. Mas é lógico que eu não iria falar nada na ausência deles, fiquei esperando alguns minutos, até que o Presidente da Escola tomou a palavra e disse - Bem vamos dar inicio a reunião; Ai eu ponderei, Sr. Presidente, a junta governativa da Ala tem uma decisão a participar aos compositores e a Direção da Escola, pelo exposto peço para que esperemos alguns minutos, para que possa chamar ai em baixo os outros membros da junta para dar inicio os trabalhos. Assim foi feito, quando os outros membros da junta chegaram, Clebinho logo me perguntou, - E ai já participou a todos a nossa decisão, no que lhe respondi, -Lógico que não estava esperando vocês, notei que ele ficou todo desconsertado, mas em questão de segundos tomou rédeas da situação e falou - Foi bom, porque nos reunimos lá em baixo e achamos por bem por o caso de João Belém para a apreciação da Assembleia, para julgarem e votarem. Apesar daquelas palavras me pegar de surpresa e ter explodido como uma bomba dentro de minha cabeça, parei pensei alguns segundos dizendo para meus botões (é quase cai nessa) e fui em frente tomando a palavra Senhores Diretores da Escola e Senhores Compositores, tendo em vista que o compositor João Belém se ausentou da Agremiação desde o final de samba enredo, não comparecendo a um ensaio sequer, e nem mesmo a uma reunião da Ala, a junta governativa da Ala, resolve colocar para a apreciação da Assembleia dos compositores em face ao exposto; Se o mesmo deveria ou não participar do concurso de samba enredo para o Carnaval de 1979. Tendo feito o relato passaremos a votação: Como vota o presidente da Ala.- Clebinho que não esperava que eu fosse começar a votação por ele, titubeou e disse; - comece por outro, e eu - Nada disso vamos começar pelo cargo mais alto da Ala. Ai ele proferiu o seu voto o que não foi surpresa para mim; eu voto para que ele concorra, e continuei seu voto Tapê, - sigo o voto do presidente e você Flavinho eu também, um a um compositor foram proferindo o voto em favor de João Belém, quando o ultimo compositor proferiu o seu voto, eu declarei; - Tendo em vista que a maioria dos votos foram para que o compositor em palta concorra a disputa de samba enredo, o mesmo esta apto a participar do concurso de samba enredo. Nisso João Tapê socilitou a palavra e cobrou o meu voto no que lhe respondi - Não e preciso votar já que ele ganhou por maioria de votos, e ele insistiu; Se todos votaram você também tem que votar. Ai proferi o meu voto da seguinte forma: - Amigo João Belém, numa reunião na semana próxima passada, da junta governativa da Ala de compositores do G.R.E.S. Acadêmicos do Cubango, foi colocado em pauta pelo presidente da junta uma proposta para que você não participasse da competição de samba enredo na Escola, pelos motivos aqui já citados, todos sem exceção concordaram com o presidente, e eu como Secretário da junta seria o encarregado de participar a Ala de compositores e a Direção da Escola nesta reunião, tal decisão, e hoje estranhamente depois de alguns acontecimentos bisonho, quando eu ia proferir a decisão da junta, o presidente Clebinho propõe que coloque o seu caso a apreciação da Assembleia de compositores o que foi feito. Como na reunião da junta na sua ausência eu votei acompanhando o voto do presidente contra você, hoje aqui na sua presença o meu voto é para que você não dispute samba enredo este ano, e faço questão que meu voto conste em ata, apesar de ser voto vencido. Depois de um silencio sepulcral continuei - Agora lhe pergunto: Já que você esta em condições de igualdade para disputar samba enredo, você quer ser meu parceiro?.
XX - Passado alguns dias após o carnaval eu acordo daquela odisseia que mais parecia um sonho mas era tão real, que esta nos anais da história da Cubango para que todos possam comprovar. Dai passei a pensar e planejar o que faria para o carnaval do ano seguinte em relação a samba enredo já que depois daquele turbilhão de emoções sentidas e vividas, estava empolgado para um novo trabalho, uma nova batalha, o meu primeiro pensamento foi de convidar o Flavinho Machado para formamos uma parceria e elaborar-mos o samba para o carnaval de 1979, passei da intenção a prática procurei o Flavinho e fis-lhe a proposto de nos juntarmos, no que me respondeu; - Eu já tinha pensado nesse assunto, só que meu parceiro João Tapê não aceitou um terceiro parceiro e ainda mais ele acha que por você ter sido Campeão esse ano, reduz ainda mais as nossas possibilidades de sairmos vencedor da competição. Confesso que naquela ocasião fiquei meio decepcionado e triste, mas o que se há de fazer, a gente não manda na vontade dos outros. Naquele período pós-carnaval, o Presidente da Ala de Compositores que era Zé do Norte, havia renunciado do cargo, e a Assembleia da mesma resolveu instituir uma junta governativa, para dirigir os destinos da Ala até completar o período governativo do então Presidente demessionário. esta junta teve a seguinte formação; Presidente: Clebinho, secretário: eu, tesoureiro: João Tapê, e Divulgador: Flavinho Machado, formada a junta o Presidente Clebinho marcou logo uma reunião para o dia seguinte e pôs em pauta a situação de um dos compositores da Ala; João Belém, alegando que o referido compositor, havia faltado a todos os ensaios da Escola após a decisão do samba enredo, e que no decorrer da disputa o mesmo só chegava alcoolizado na quadra, (É bom lembrar que João Belém morava no morro do abacaxi, berço da Escola, e por sua humildade, educação e ser uma pessoa imensamente prestativo, embora nunca ter ganho um samba enredo até aquela data na Escola, era o compositor mais querido da Escola, e toda a comunidade gostava dele), feito a explanação propôs que João Belém não participasse da disputa de samba enredo naquele ano posto em votação, João Tapê e Flavinho acompanharam o voto da Presidência, e eu como compositor mais novo, acompanhei o voto dos mais antigos. Ficou combinado que a próxima reunião seria na data da entrega da sinopse, e como Secretário da junta ao iniciar a reunião participaria a Ala e a Direção da Escola a decisão tomada pela junta. Passou-se o tempo, eis que chega o dia da apresentação do Carnavalesco e consequentemente da entrega da sinopse, bons tempos em que tudo era guardado a sete-chaves, tudo para que os adversários fossem pego de surpresa na Avenida, Na reunião estavam presente todos o compositores, faltando justamente os outro três membros da junta, nisso chegou o Presidente da Escola acompanhado por alguns diretores e uma pessoa que eu não conhecia que logo em seguida ficamos sabendo que era o Sr. Carlos Alberto da Costa o novo carnavalesco da Escola.
XIX - O bom é que naquela época havia muita união entre compositores, diretores, e componentes de uma maneira geral, tanto é que após aquele desfile majestoso, nos reunimos no final da Avenida, junto aos carros alegóricos, já que fomos a ultima escola a desfilar, mandamos comprar algumas cervejas e ficamos ali tecendo comentários sobre o acontecimento do desfile até a parte da tarde, quando esgotou o assunto fomos levar os carros para o barracão da escola que ficava atraz do antigo Maveroy, perto do Moinho atlântico, no ginásio da antiga CEDAE, depois já exausto peguei o meu ônibus para Cachoeiras de Macacu onde passei o resto do Carnaval. Chega quanta-feira de cinzas, acordei cedo uma tremenda ansiedade veio me abraçar, me arrumei e desci para Niterói, para assistir a apuração que seria efetuada no Quartel do Décimo Segundo Batalhão de Policia Militar, ao chegar lá, encontrei o ginásio lotado nas arquibancadas um alvoroço, bandeiras, baterias de diversas escolas de samba em cada torcedor a gente sentia a ânsia, a expectativa do resultado favorável, era latente a manifestação de amor pelas suas bandeiras, me juntei ao pessoal da Cubango confiante de um bom resultado, eis que começa a contagem dos votos, nos quatros primeiros quesitos a Cubango e Viradouro vinha mantendo uma disputa ferrenha ambas com dez em cada quesito, eu ouvi bem quando o comunicador da Associação das Escolas de Samba de Niterói anunciou "O quinto quesito é samba enredo", me lembro que as escolas eram chamadas por ordem alfabéticas, ele começou Caçadores da Vila nota tal, Combinados do Amor, tal, Corações Unidos nota Tal, Cubango, deu uma pausa, foram segundos que parecia uma eternidade, meus neurônios parecia que iam explodir meu coração acelerou fazendo subir minha batida rítmica ao ouvir soar a voz que dizia Cubango dez nota dez, senti um alivio tão grande que parecia que um peso de uma tonelada teria saido de cima de mim, e naquele quesito a Viradouro perdeu o carnaval tirando 8,5, continuou a votação e a cada dez que a Cubango tirava, era uma explosão de alegria no final da contagem foi anunciado "Cubando Campeão do carnaval de 1978". Foi contagiante a euforia que tomou conta de toda a nação Cubanguense, abraços, choro, risos, gritos de é campeão, apareceu o mestre sala e porta bandeira da Cubango com seu pavilhão, peças de bateria e foi com muita alegria que eu vi Sororóca um eis goleiro e dos bons com suas esposa ele tocando cuica e ela no chocalho, foi se formando um grande bloco e saimos do quartel na Jasem de Mello pegamos Av. Feliciano Sodré, desembocamos na Alameda São Boa Ventura, subimos e descemos a 22 de Novembro cantando, sambando e paramos na Noronha Torrezão em frente ao terreno que hoje e a séde da Agremiação, ali encontramos com uma multidão incalculável comemoramos com fogos de artifícios e bebidas até não podermos mais, afinal de contas não é sempre que uma escola de samba se sagra tetra-campeã do Carnaval consecutivamente